sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

O SONHO DE ANO-BOM DA MOÇA LOIRA




Genesino Braga



A Moça-Loira entra na boite e os acordes do primeiro blue a arrebatam para a quintessência de seus doces devaneios...
A música é uma pasta melódica que escorre sons indolentes e sem pressa sobre o tablado da imaginação. Fermata infinita celebrando a suave tristura de algum recalque sem remédio... Sopro consolador da alma aflita, que suscita delitos impossíveis e gera o eflúvio dos pensamentos proibidos... Recado de todas as distâncias, no tempo, que a trompa emite e a alma capta no epitáfio dos ritmos desfalecentes... Solo exausto e sensual dos desesperos de sobreviver...
A Moça-Loira dança o blue no esvazamento da sua interioridade emocional. Dança e sonha... Uma espécie de êxtase votivo apazigua-lhe a carne ansiosa, em sua orgulhosa veemência de pecar. As sombras dos desejos insatisfeitos atropelam-se em fugas sensoriais, como imagens recalcadas da última tormenta. Sua alma é a paz; seu espírito é a indulgência dos apelos dilacerados; seu sangue a desmemória dos impulsos superados...
A Moça Loira sente, na nota elástica da música, a lenta filtração da mocidade. Os alaridos da entrada do Ano-Bom acordam-lhe os pensamentos sensatos na determinação do tempo. Há folhas de outono, já, moisacando paisagens à sua frente. A tênue penumbra ambiente traz-lhe a intimidade das vozes sentenciosas da vida... Mas, a Moça Loira é toda uma aceitação do irremediável, e seu fortuito pensamento de Ano-Bom. Dança e sonha... aos braços vigorosos que a enleiam, intencionais, outros mais sucederão, em líames táteis de volúpia, na impetuosa desintegração do plasma. Esquece, assim, os sopros rígidos do tempo e refugia-se na idéia vã de perpetuar o seu enternecido devaneio. As notas longas e lascivas daquele blue desapressado bem poderão suprimir todas as tintas da lembrança e deixarem-na parar naquele sonho, distanciada, em nostálgico recuo, dos festivos silvos e alaridos que saudavam, sim, a fuga de sua mocidade.
Ah!, o sonho de Ano Bom da Moça-Loira, no doce enlevo daquele lânguido blue de notas mansas...

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